29.12.12

Senseless - Capítulo 1

Era uma tarde agradável. O céu antes azul estava alaranjado, mas ainda sem sinal de nuvens. A brisa fresca soprava, bagunçando os cabelos de Emi, que resmungava enquanto refazia suas marias-chiquinhas. A rua deserta já era rotina, esta cidade estava longe de ser grande, modernizada e lotada quanto Tókyo, a cidade natal de ambos. Esta era uma cidade rural e antiga, sem surpresas, onde todos se conheciam.

– Akio! Me espera! – Emi gritava emburrada, correndo atrás do ruivo idêntico a ela.

– Você é muito lerda! – Seu irmão gritou de volta, rindo.

 A garota desistiu de tentar acompanhar Akio e ficou olhando para um muro próximo. Lá havia pichações que os dois fizeram quando eram pequenos. Os ‘’pequenos infratores’’, como sua mãe havia dito naquele mesmo dia, receberam um castigo bem grande por resolver pintar os muros da cidade, mas nunca apagaram. Emi sorria ao lembrar das pequenas travessuras que ela e seu gêmeo faziam.

– Oye, o que está fazendo? – Seu irmão disse, depois de chegar como um fantasma por trás dela, fazendo a mais baixa dar um pulo de susto.

– Achei que já estivesse lá na frente. – Ela disse, olhando para ele.

– E ser assassinado pela mãe quando chegar em casa? Hm, não, obrigado. – O ruivo maior disse, revirando os olhos em seguida, a fazendo rir.

– Certo, certo. – Emi disse pegando a mão do outro, e puxando-o. – Vamos então, eu não quero que o pai fique fazendo mil perguntas quando chegarmos.

– Você fala como se fosse minha culpa quando foi você que empacou!

– Você que resolveu voltar!

– Eu não tava a fim de ser decapitado, porra!

 Os dois se entreolharam e começaram a rir. Era sempre assim quando iniciavam uma discussão, não conseguiam brigar com o outro por mais de cinco minutos.

 Passaram as antigas casas e os muros descascados da pequena cidade, caminhando pelas ruas que claramente precisavam de um re-asfaltamento. Apesar de todos os problemas dali, adoravam aquele lugar, afinal, fora ali que eles cresceram.

 Não demoraram a chegar em casa. Estranharam as portas abertas, mas simplesmente acharam que havia alguma visita ou algo parecido, e entraram.

...A casa estava completamente deserta.

 Não havia sinais de ninguém ali dentro. Na verdade, a casa parecia abandonada há anos, ou no mínimo, um tornado teria passado por ali. Os dois fitaram os móveis quebrados e papéis espalhados pela sua antiga sala de estar, enquanto a garota começava a tremer. Eles se entreolharam enquanto decidiram quase telepaticamente vasculhar a casa vazia.

 Emi ficava cada vez mais assustada a cada passo que dava. Sentia que tinha que sair dali, que algo estava muito errado. Isso foi até a mesma ver um rastro de sangue em meio a confusão de cacos e madeira quebrada no corredor, tendo que tampar a boca para abafar um grito.

***

Emi POV

 Eu quero sair daqui. Isso não é bom, isso não é bom.

 Eu sentia minhas pernas bambas. Sequer notei quando meu irmão começou a seguir o rastro de sangue.

 – Akio...- O chamei, fazendo-o olhar pra mim. – Não vá andando na frente sozinho... – Meus olhos começaram a se encher de lágrimas. Eu estava morrendo de medo. Eu não sabia o que tinha acontecido com meus pais, tampouco o que aconteceria conosco agora. E eu não queria de maneira alguma ficar sozinha ali.

 Ele assente levemente enquanto eu agarro sua mão. Escutamos passos no andar de cima, e eu travei.

 Eu quero ir embora. Eu quero acordar. Isso não pode passar de um pesadelo!

 Meu irmão tentou me acalmar, falando baixinho que poderia ser algum de nossos pais. Subimos até o quarto que eles estavam, e minha visão se turvou enquanto caí no chão pelo choque, e meu irmão também paralisou ao meu lado.

 Lá havia uma poça de sangue onde deveria estar o antigo tapete felpudo. E os corpos decapitados e ensangüentados de nossos pais, bem ao meio do quarto.

 Akio pega com a mão trêmula uma foto que havia no chão, enquanto eu fitava aquilo tudo. Isso não podia estar acontecendo de verdade.

 Escutamos passos, e num instante, Akio me puxou para me levantar, e correu até o primeiro andar novamente, praticamente me arrastando. Os passos ficavam cada vez mais próximos, e eu não via nada, além de minhas pernas não me ajudarem mais sequer a andar. Entramos em nosso quarto e ele trancou a porta, abrindo o guarda-roupa e me colocando lá dentro, entrando logo em seguida.

 Ouvimos o som da maçaneta girando e ser impedida pela tranca, sendo a porta arrombada logo após com uma força sobrenatural. Eu me encolhi, em lágrimas, enquanto sentia meu irmão tremer e suar frio, enquanto parecia procurar por algo.

 Eu sabia que não tínhamos muito tempo até a pessoa que vagava por nosso quarto nos achar. Eu chorava compulsivamente, sem som, até Akio abrir algo que parecia com um fundo-falso do armário. Apesar da escuridão, pude ver as escadas, e sabia que meu irmão queria que descêssemos por ali, rápido. 

 Os passos se aproximavam. Rastejei para dentro da escada o mais rápido que pude, sendo seguida por meu irmão. Assim que ele fechou novamente o fundo-falso, pude ouvir a porta do guarda-roupa sendo aberta, e alguns longos segundos depois, fechada novamente, enquanto a pessoa se afastava.

 Encostei na parede úmida da escada, sem conseguir mais dar um passo sequer. Minha cabeça rodava. Eu me sentia igual ou pior aos cacos que vimos no corredor e meu coração parecia que iria sair pela boca.

 Eu e meu irmão estávamos a salvo. Vivos. Os dois.

 E antes de desmaiar, senti Akio me segurar e me colocar em suas costas.


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